O presidente da Romênia Emil Constantinescu, veio ao Brasil numa missão econômica, onde estava agendada uma reunião com 450 empresários na FIESP, além de diplomatas dos dois países para formalizarem acordos bilaterais que permitiria um maior intercâmbio comercial e cultural.
Ao chegarmos na FIESP , a Assessoria do Senhor Presidente me informou do seu interesse em assistir o jogo de futebol entre Brasil e Argentina, que seria realizado à noite no Estádio do Morumbi em São Paulo, e que ele por ser torcedor da seleção brasileira, por todos os seus feitos na história do futebol gostaria, se possível de assistir esse partida de futebol.
Nesse momento, me tranquei numa sala contígua ao plenário e realizei uma série de telefones ao presidente da Federação Paulista de Futebol , à CBF, Confederação Brasileira de Futebol, aos diretores do São Paulo Futebol Clube, dono do Estádio, e após alguns minutos, havia conseguido a liberação para o Senhor Presidente Constantinescu assistisse a partida na Tribuna de Honra.
Deste ponto em diante, teria que tomar uma série de providências estratégicas junto aos órgãos de segurança para que essa missão se realizasse com sucesso. Era um jogo valendo uma vaga na Copa do Mundo de Futebol, o estádio estaria lotado e a presença dos torcedores argentinos seria maciça, face a proximidade entre os dois países, e óbvio que a torcida brasileira estaria presente para esse confronto com os argentinos que é uma tradição no futebol.
Ao acertar todas essas medidas -e sabendo que não teríamos muito tempo para decisões, elaborei um bilhete ao Senhor Presidente , onde estava escrito – Consegui, vamos ao jogo, tudo OK ! – ao adentrar o recinto onde o Senhor Presidente proferia uma explanação sobre a economia do seu país , num debate amplo com economistas e empresários, temia o momento certo de fazer chegar as suas mãos , aquele bilhete.
Numa pequena pausa de respiração entre os debatedores, decidi, tem que ser agora… acessei o palco, cheguei junto ao Senhor Presidente, mostrei o bilhete, onde para o meu espanto, abriu-se um sorriso enorme. O presidente Emil Constantinescu, comentou , sussurrou ao Presidente da FIESP, e imediatamente, declararam: – Esta encerrado esse debate…
Saímos as pressas da sede da FIESP, embarcamos em veículos, em direção ao hotel, onde fomos deixar a primeira dama da Romênia, – quando ouço e vejo o Presidente dizem: – pode deixar eu me troco dentro do carro. Bye ! – eu não acreditei nessa história.
No trajeto para o Estádio, o senhor presidente, tirou a gravata, trocou de camisa social, por uma camisa esporte, tirou o paletó, notava que ali já era o torcedor e não mais o presidente.
Mantive contato com a área Coordenação Operacional do Polícia Militar, para que tivesse facilidade de acesso ao Estádio, mesmo tendo como apoio os policiais do Pelotão de Escolta Motorizada, pois a preocupação é que estaria chegando no horário em que as torcidas dos dois países estariam chegando ao Estádio.
O nível de atenção redobrou. Decidimos por empenhar a tropa montada do Regimento de Cavalaria que fazia o policiamento na região, formou-se um corredor para abrir um caminho daquela massa humana que ocupava todas as ruas da região, fizemos um acesso pela avenida contrária ao Estádio, e após esse corredor de policiais montados, entramos com a formação de policiais da escolta, fazendo um segundo corredor, e assim sim, chegaram os carros do comboio, sendo apenas nesta formação de 6 veículos, dois carros da comitiva presidencial , e os demais da Polícia Federal, o detalhe era o seguinte, que haviam outras autoridades presentes no Estádio, entramos pelo portão 17, que dá acesso a Tribuna de Honra.
Meu alívio veio quando o senhor Presidente tomou sua cadeira na primeira fila da Tribuna de Honra, e notava que ele carregava uma bolsa na mão , não largava aquela bolsa, pequena,. ..Notava que realmente a paixão pelo futebol era enorme. , quando a seleção brasileira foi para o ataque e marcou o primeiro gol contra os argentinos, o Presidente pulava, gritava, como fosse o mais fiel torcedor brasileiro. , foi uma comemoração efusiva….Cheguei sutilmente a cadeira do Senhor Presidente e informei que a pessoa que estava ao seu lado, era o Presidente Raul Alfonsin, da Argentina, que obviamente, não estava nada contente com o resultado e muito menos com a euforia das comemorações do Presidente da Romênia.
Ele se apresentou, usou da diplomacia internacional para contornar a situação, e voltamos a respirar. Lembro aqui, que o Presidente Argentino também estava com a proteção do Polícia Federal Brasileira além dos agentes de segurança argentinos. A conclusão é quase óbvia, havia mais armas na Tribuna de Honra do que em qualquer Quartel General do Exército.
Bem, finalmente, chegamos ao intervalo do jogo, o presidente continuava segurando aquele bolsinha, que nesse momento começava a ser aberta, quando noto que o Senhor Presidente, tinha uma lancheira, com dois sanduíches misto frio. No primeiro momento, não acreditei.
Depois compreendi. Fui até o senhor Presidente e informei que na Tribuna de Honra, havia um amplo coquetel, com vários tipos de bebidas, além de um jantar com pratos quentes. Ele imediatamente, fechou aquela lancheira, não tocou nos sanduíches e fomos jantar devidamente junto as demais autoridades presentes.
980717- Romanian President Emil Constantinescu (right),. DoD photo by R. D. Ward.
Ao sairmos do Estádio, foi outro momento tenso, pois enquanto não saísse a comitiva do presidente argentino e a nossa comitiva, todos os torcedores que havia guardado seus carros junto aquela saída, estavam impossibilitados de sair, começou então um festa com um barulho ensurdecedor, a tensão começou a aumentar, com o nervosismo dos torcedores argentinos e do próprio presidente argentino, decepcionado com a atuação da seleção do seu país.
Ao sairmos do Estádio, formou-se o mesmo procedimento de chegada, tendo a escola montada formando um paredão de isolamento, saímos com as motos do pelotão de escolta e os carros da comitiva,
Neste momento de muita tensão, cabe ressaltar que os populares não imaginam quem esteja dentro daquele carro preto, com pouca visibilidade das pessoas, e começam a fazer ameaças, fazendo xingamentos e ofensas e outras fazendo baderna, festejando a vitória da seleção brasileira nesse jogo. Após alguns kilometros percorridos, a tropa relaxou, recolhendo todas as armas expostas nas janelas dos veículos e seguimos aliviados com destino ao hotel.
